As fake news são um fenômeno que
continuará a causar desinformação nas próximas eleições. O combate delas por
meio das leis penais é insuficiente e ineficiente. O WhatsApp é a plataforma em
que o enfrentamento é mais difícil. A solução não deve ser por meio de censura,
mas pelo uso de ferramentas de checagem e pela prática do jornalismo
profissional. Essas são algumas das previsões e conclusões de especialistas que
participaram, nesta sexta-feira (17), de um seminário internacional promovido
pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em parceria com a União Europeia para
discutir as fake news. Representantes de três das principais plataformas,
WhatsApp, Facebook e Twitter, apresentaram no evento iniciativas tomadas para coibir
a propagação de informações falsas, especialmente em período eleitoral. “O
WhatsApp não é uma plataforma pública, ele é desenhado para ser um app de
mensagens particulares, diferentemente do Facebook e do Twitter, que são uma
praça pública”, disse Ben Supple, gerente de políticas públicas do WhatsApp, ao
tratar das dificuldades encontradas. Segundo ele, nem o próprio aplicativo vê
as mensagens trocadas, o que faz a empresa ter conhecimento limitado sobre quem
são os usuários e quais são seus comportamentos. Algumas medidas, porém, foram
tomadas, como a limitação de encaminhamentos simultâneos, segundo Supple. Nas
eleições de 2018 no Brasil, uma mensagem podia ser repassada para apenas 25
usuários por vez. Ainda segundo Supple, o WhatsApp bane cerca de 2 milhões de
contas por mês, por meio de inteligência artificial empregada para identificar
condutas suspeitas. Já o gerente de políticas públicas do Twitter, Fernando
Gallo, destacou iniciativas da plataforma como as contas que têm sua
autenticidade verificada e a desativação de robôs —o que, segundo ele, fez cair
pela metade o número de denúncias de spam por usuários desde 2017. O Facebook
afirmou que apostou em transparência. “Toda propaganda eleitoral que rodou no
Facebook foi para uma biblioteca de anúncios, pesquisável. Todo esse conteúdo
vive no Facebook por sete anos, e o pesquisador tem acesso à propaganda, ao
valor gasto e ao público que foi atingido”, disse Mônica Rosina, gerente de
políticas públicas do Facebook no Brasil. O consultor de marketing digital
Marcelo Vitorino propôs que o TSE passe a cadastrar empresas que fazem disparos
de mensagens via WhatsApp para auxiliar candidatos que queiram contratar esse
tipo de serviço de forma legal. “Assim como o TSE homologou empresas de
‘crowdfunding’ [financiamento coletivo], facilitou muito a vida da gente. Que
empresa de ‘crowdfunding’ eu vou contratar? Eu vou contratar uma que já está
homologada pelo TSE. As mesmas regras poderiam ser estendidas às empresas de
big data que disparam mensagens de WhatsApp, porque facilitaria para o agente
político a contratação de alguém que é sabidamente seguidor da lei”, sugeriu. Em
um painel do seminário no TSE voltado à discussão dos limites da liberdade de
expressão, a advogada Taís Gasparian, que advoga para a Folha e é especialista
no assunto, disse que qualquer controle da liberdade de expressão tem de ser
posterior à divulgação da informação. Nesse caso, há dois caminhos possíveis
para quem se sentiu prejudicado: ajuizar uma ação de indenização e/ou pedir
direito de resposta. “A Constituição cita a palavra ‘censura’ duas vezes, e é
para vedá-la”, afirmou. “A Constituição cita a palavra ‘censura’ duas vezes, e
é para vedá-la”, afirmou. Para o delegado Flúvio Garcia, da Polícia Federal, e
para a procuradora da República Raquel Branquinho, que atua na PGR
(Procuradoria-Geral da República), as leis penais não dão conta de combater as
fake news. “O caminho não é o direito penal, não é o direito processual penal
que irá resolver essa questão”, disse Garcia. Apesar disso, a PF distribuiu às
delegacias de todo o país um roteiro com artigos do Código Penal, do Código
Eleitoral e de leis como a do racismo que preveem crimes nos quais as fake news
podem se enquadrar, a fim de auxiliar os investigadores nos estados. Nessa
lista estão os crimes contra a honra na propaganda eleitoral e de divulgação de
pesquisa eleitoral falsa, ambos previstos no Código Eleitoral, e o de
contratação de grupo para ofender a honra ou denegrir imagem na internet. Segundo
Branquinho, é difícil enquadrar as fake news nas definições de crime existentes
porque todos os tipos penais têm, além dos elementos objetivos —que são
facilmente verificáveis—, elementos subjetivos dificilmente comprováveis. Um
exemplo é o artigo 323 do Código Eleitoral, que diz que é crime “divulgar, na
propaganda, fatos que sabe inverídicos, em relação a partidos ou candidatos e
capazes de exercerem influência perante o eleitorado”. A dose de subjetividade
está na parte final, que exige que a informação falsa seja apta a influenciar
os eleitores.
Folhapress
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