Vulnerabilidade brasileira abre
oportunidade para a entrada de empresas chinesas no país, numa onda de aportes
cercada de críticos e entusiastas.
A crise política e os escândalos
de corrupção abalaram o Brasil nos últimos anos, evolvendo desde políticos de
alto escalão a conhecidos empresários.
Entre os afetados está Eike
Batista, o extravagante magnata que em 2014 viu seu conglomerado ruir em meio a
promessas exageradas que não geraram o retorno previsto aos credores e
acusações de uso de informação privilegiada.
No entanto, um projeto de Eike
permaneceu a pleno vapor: o porto de Açu, no Rio de Janeiro. Apelidado de
“estrada para a China”, o porto foi revitalizado por seu novo proprietário, a
gestora de fundos de investimentos americana EIG Global Energy Partners. E ao
que tudo indica, o porto pode ter em breve uma parte adquirida pela China. Localizado
em São João da Barra, no norte do Rio de Janeiro, o porto já serve de base para
envio de minério de ferro para a China e fica a 150 quilômetros da Bacia de
Campos, que é responsável pela maior porcentagem de produção de petróleo do
país. Além disso, a região contém blocos de pré-sal, nos quais duas petroleiras
chinesas têm interesse: a Sinope e a Cnooc.
A americana EIG pretende expandir
o porto de Açu e diversificar seus investimentos no Brasil, com planos que
envolvem os setores de energia e ferrovias, que também são cobiçados pela
China. Para isso, a parceria com os chineses será crucial. “Os chineses são
parceiros importantes, em longo prazo eles adquirem tamanha massa crítica que
você deseja que eles não sejam apenas clientes, mas sócios”, diz Robert Blair
Thomas, chefe executivo da EIG.
O interesse de empresas chinesas
em Açu é apenas uma fração dos investimentos da China no Brasil, que nos
últimos dois anos experimentou uma onda de aportes chineses, que envolve desde
o setor de energia ao de agricultura e alimentos, passando pelo de aviação civil.
Segundo uma recente pesquisa da empresa de consultoria Dealogic, este ano os
investimentos chineses no Brasil já movimentaram US$ 10,9 bilhões (cerca de R$
35 bilhões).
Alívio financeiro, alerta
político
Para o Brasil, o interesse da
China não poderia chegar em melhor hora. Em meio a uma crise política e uma
economia que encolheu 7% somente nos últimos dois anos, os aportes chineses são
um alívio para as agruras do país. Além disso, a onda de aportes chineses
coloca o Brasil em um papel de relevância na região. Desde 2005, a China já
emprestou mais de US$ 140 bilhões para a América do Sul, metade deste total
teve como destino a Venezuela.
No entanto, a turbulência no país
vizinho, que está em risco de moratória, fez a China buscar parceiros mais
estratégicos e com uma situação financeira mais sólida – em especial, o Brasil.
Os investimentos da China em outros países caíram 40% nos primeiros cinco meses
deste ano, enquanto saltaram no Brasil, como apontou a pesquisa da Dealogic. Entusiastas
da parceria veem a aproximação entre os países como um “casamento perfeito”
entre duas potências emergentes – a China, uma líder em rápido crescimento; e o
Brasil uma potência agrícola rica em recursos naturais.
“Acho que é a combinação
perfeita. A China tem excesso de capital e experiência em infraestrutura e eles
precisam do que nós temos – que são matéria-prima e alimentos”, diz Marcelo
Kayath, ex-executivo do banco Credit Suisse no Brasil. Porém, a aproximação
entre os dois países vem gerando críticas de políticos nacionalistas empenhados
no pleito presidencial do próximo ano. Além disso, Washington, que sempre
considerou a América do Sul um quintal dos EUA, também está em alerta com a
onda de aportes chineses no continente.
“Se o Brasil, como todo seu peso
econômico e influência na região, se tornar altamente ligado à China, com
certeza mudará um pouco o panorama estratégico”, diz Robert Evan Ellis,
professor e pesquisador especializado em estudos da América Latina do Instituto
de Estudos Estratégicos da Escola de Guerra do Exército dos EUA.
O papel da Lava Jato na onda de
aportes
A entrada de empresas chinesas o
Brasil também é impulsionada pelos escândalos de corrupção revelados na
Operação Lava Jato. Grandes empresas envolvidas em fraudes e propinas
decretaram falência, pediram recuperação judicial ou abriram mão de ativos em prol
da sobrevivência. A Odebrecht, por exemplo, vendeu em julho deste ano, por US$
310 milhões (R$ 1 bilhão) sua participação no aeroporto do Galeão (RJ) para o
grupo chinês HNA, que também é acionário da Azul Linhas Aéreas, a terceira
maior empresa aérea do Brasil, atrás apenas da TAM e da Gol.
Até o momento, as empresas
chinesas não vêm enfrentando resistência no Brasil, como na Austrália, por
exemplo, onde elas foram barradas de adquirir terras e algumas empresas de
transmissão de energia. Em 2009, o governo Lula limitou a compra de terras
agrícolas brasileiras por estrangeiros. Mas o atual governo do presidente
Michel Temer já anunciou pretende abolir essa restrição.
No entanto, segundo Larissa
Wachholz, diretora da empresa de consultoria Vallya, que tem investidores
chineses entre seus clientes, a onda de aportes pode desacelerar à medida que
as empresas aumentam sua participação em setores de serviços estratégicos. “No
momento que os chineses entrarem em massa em áreas estratégicas, terão de
começar a pensar em estratégias de relações públicas, porque vão atrair a
atenção de pessoas que não gostam disso”, explica a diretora.
A opinião de Wachholz é
corroborada por Ellis. “Embora se trate de economia, acho que há um componente
político nisso”, diz Ellis. Segundo ele, o Brasil pode começar a sujeitar as
estatais chinesas a um grau maior de escrutínio, similar às revisões de
segurança conduzidas pelo Comitê de Investimentos Estrangeiros nos Estados
Unidos.
Ellis dá como exemplo o recente
interesse da China Mobile, a maior empresa de telefonia da China, em adquirir a
Oi, a operadora de telefonia permeada de conflitos internos. “O Brasil pode
passar a estudar com mais rigor os setores onde está permitindo a entrada da
China. Se a China Mobile adquirir a operadora que tem 64 milhões de usuários no
país (a Oi), será, provavelmente, o maior passo dado pela empresa em um país
estrangeiro”, diz o pesquisador.
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