Caixa processa Dilma na Justiça
pelas "pedaladas fiscais" que ela diz que não cometeu: o rombo é de
R$ 274,4 milhões.
(O Globo) A Caixa Econômica
Federal cobra na Justiça R$ 274,4 milhões da União por conta de “pedaladas” dos
ministérios das Cidades e da Agricultura. As duas pastas deixaram de pagar
taxas de administração por serviços prestados pelo banco público na execução,
por exemplo, do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), no caso de
Cidades, e de projetos financiados com emendas parlamentares, no caso da
Agricultura.
Desde o fim de 2013, duas ações
de cobrança tramitam na 1ª e na 5ª Vara Federal em Brasília e, até agora, não
haviam sido divulgadas. A falta de repasses do governo a bancos oficiais é
justamente uma das principais acusações feitas à presidente Dilma Rousseff no
Tribunal de Contas da União (TCU). Nas chamadas “pedaladas fiscais” nas contas
de 2014, o Executivo federal fez com que bancos públicos, como a Caixa,
arcassem com despesas de programas federais, sem que a União repassasse os
recursos previstos. Na última semana, o governo entregou a defesa no processo
que tramita no TCU e que pode detonar a próxima crise no governo Dilma.
A Advocacia Geral da União (AGU),
que atua em nome do governo no TCU, também faz a defesa dos dois ministérios na
Justiça Federal, e tenta derrubar as ações de cobrança. A Caixa insiste na
briga judicial com a União. A dívida do Ministério das Cidades é de R$ 188,1
milhões, incluída a atualização monetária. A do Ministério da Agricultura, R$
86,3 milhões, conforme documentos obtidos pelo GLOBO. Num dos processos, a AGU
argumenta que a inadimplência não foi “dolosa”, “ilícita” ou por “má-fé”, mas
decorre de uma “burocracia do Estado”. “A alta demanda por recursos públicos
por vezes acarreta em certo descontrole de contas, situação passageira e que
rapidamente é organizada”, sustenta o órgão.
Até então não se sabia da
existência de judicialização de uma fatia das “pedaladas” fiscais, com um banco
da União e a própria União em lados opostos. Só se conheciam cobranças feitas
pela Caixa na Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal, uma
instância administrativa que funciona junto à AGU. As tentativas de conciliação
foram frustradas, por conta da falta de disposição dos ministérios em fazer os
pagamentos da dívida.
ADVERTISEMENT
Ao todo, foram abertos seis
processos de conciliação referentes às “pedaladas”. Dois deles, que dizem
respeito à cobrança das taxas de administração, acabaram na Justiça. Um parecer
da AGU anexado aos processos, de março deste ano, relaciona a falta de
pagamento dessas tarifas ao conjunto de represamentos de recursos que
configuram a manobra fiscal que está sendo questionada também no TCU.
O governo, em especial em 2013 e
em 2014, segurou repasses de recursos aos bancos oficiais para o pagamento de
programas e benefícios sociais como o Bolsa Família, o seguro-desemprego e o
abono salarial. Os bancos se viram obrigados a arcar com os pagamentos. Os
contratos de prestação de serviços preveem que os ministérios paguem taxas às
instituições financeiras por conta dos serviços executados. Agora, a presidente
Dilma Rousseff corre o risco de ter as contas de 2014 rejeitadas em razão das
“pedaladas”. O governo tem que alegar que a manobra não causou qualquer tipo de
prejuízo.
O TCU considerou a prática uma
operação de crédito e, portanto, uma infração à Lei de Responsabilidade Fiscal
(LRF). O represamento de repasses foi feito para melhorar artificialmente as
contas públicas, segundo o TCU, e totalizou R$ 40 bilhões entre 2009 e 2014. O
julgamento no TCU deve ocorrer entre o fim deste mês e o início de outubro. Um
eventual parecer pela rejeição deve ser utilizado pela oposição para pedir o
impeachment da presidente. A palavra final sobre a rejeição é do Congresso.
A ação da Caixa na Justiça
motivou cobranças internas no governo por repasses de recursos. Em abril de
2014, o então ministro da Agricultura, Neri Geller, enviou ofício ao então
ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini. No
documento, Geller citou a “cobrança judicial por parte da Caixa” e pediu a
liberação de R$ 10,5 milhões “em caráter prioritário”.
O ministro informou a Berzoini
que o dinheiro se refere a tarifas devidas à Caixa para execução de projetos a
partir de emendas parlamentares. No ofício, ele não mencionou que a dívida é
bem maior do que o valor cobrado. Berzoini deu encaminhamento ao Ministério da
Fazenda, como consta em outro ofício.
No momento em que a ação de
cobrança foi protocolada na Justiça, o valor da dívida era de R$ 57,7 milhões.
O valor cresceu a partir de então, chegando a R$ 86,3 milhões em julho deste
ano, como consta no processo. A AGU chegou a argumentar que a dívida referente
a contratos vigentes até 2010 estaria prescrita, o que foi contestado pela
Caixa. A defesa do Ministério da Agricultura falou também em “falha de
comunicação”. “Em nenhum momento o réu objetivou ficar inadimplente, gerar
danos ao agente financeiro ou ainda enriquecer indevidamente”, citou a AGU.
Já a dívida do Ministério das
Cidades é composta por diferentes taxas de prestação de serviços que deixaram
de ser pagas à Caixa, como para operação do PAC. Dados reproduzidos pelo banco
na ação de cobrança mostram que praticamente nada foi pago em 2012 e em 2013 —
a proporção de pagamentos em relação a valores cobrados foi bem menor nestes
dois anos do que nos anos anteriores.
Para tentar derrubar as ações de
cobrança, a AGU alegou à Justiça que iniciativas de conciliação estavam em
curso na esfera administrativa. Mas a própria Caixa lembrou aos juízes que não
houve acordo para o pagamento das dívidas, o que justificava a continuidade dos
processos. O banco disse ter recebido apenas uma pequena fatia do dinheiro
devido.
Por meio da assessoria de
imprensa, a Caixa afirmou ter “convicção de que os valores serão recebidos, em
decorrência das negociações em curso com o ministério”. O banco não respondeu
por que decidiu acionar a União na Justiça para receber as dívidas com tarifas.
O Ministério das Cidades informou, via assessoria de imprensa, ter pago R$ 21,7
milhões à Caixa. “O ministério já solicitou a reabertura da negociação junto à
Caixa, na Câmara de Conciliação da AGU. Portanto, a conciliação na esfera
administrativa está caminhando normalmente”, disse.
A pasta negou que a dívida tenha
“relação alguma com o que a imprensa convencionou como 'pedalada', pois não são
recursos utilizados para a execução de determinado programa do governo
federal”. “Os pagamentos discutidos aqui são pagamentos realizados pelo
Ministério das Cidades à Caixa, em função de uma relação contratual. É um valor
que não se confunde com os recursos investidos pelo ministério.” O Ministério
da Agricultura não respondeu aos questionamentos da reportagem.
Sem comentários:
Enviar um comentário
obrigado pela sua participação grato
por sua visita!...e fique a vontade para opinar.