SL 888 MC / MA - MARANHÃO
MEDIDA CAUTELAR NA SUSPENSÃO DE LIMINAR
Relator (a): Min.
Presidente
Julgamento: 24/06/2015
Decisão Proferida pelo (a)
Min. RICARDO LEWANDOWSKI
Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-125 DIVULG 26/06/2015 PUBLIC 29/06/2015
Partes REQTE.(S) :
GLEIDE LIMA SANTOS
ADV.(A/S) : RAVIK DE
BARROS BELLO RIBEIRO
REQDO.(A/S): TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO
ADV.(A/S) : SEM
REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
INTDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO
MARANHÃO
INTDO.(A/S) : WAGNER
DE CASTRO NASCIMENTO
ADV.(A/S) : ANTONIO
MALAQUIAS CHAVES JUNIOR
INTDO.(A/S) :
DALVADISIO MOREIRA DOS SANTOS
ADV.(A/S) : GLEYSON
GADELHA MELO
Decisão
Trata-se de suspensão de liminar, com pedido de medida
cautelar, ajuizada pela Prefeita do Município de Açailândia/MA, contra decisão
do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, que determinou o seu afastamento
do cargo por suposta prática de crimes.
Consta dos autos que a Primeira Câmara Criminal do Tribunal
de Justiça do Estado do Maranhão recebeu a denúncia contra a requerente e
outras duas pessoas (Wagner de Castro Nascimento e Dalvadisio Moreira dos
Santos), pela suposta prática dos crimes previstos no art. 1º, II, do
Decreto-Lei 201/67 (crime de responsabilidade dos Prefeitos Municipal -
“utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou
serviços públicos”), combinado com o art. 29 do Código Penal, por que a
1ª Promotoria de Justiça Especializada da Comarca de
Açailândia/MA teria recebido, em 12/11/2013, “um CD contendo gravações em vídeo
de onde supostamente constata-se máquinas e servidores municipais realizando
obras de terraplanagem no interior da
Fazenda Copacabana, que seria de propriedade da Requerente”
(pág. 2 do documento eletrônico 2).
O julgamento, realizado em 26/5/2015, determinou o imediato
afastamento da Prefeita, tendo o Vice-prefeito assumido no dia seguinte.
O acórdão, por seu
turno, foi assim ementado:
“UNANIMEMENTE E DE ACORDO COM O PARECER DA DOUTA PROCURADORIA
DE JUSTIÇA, A PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL RECEBEU A DENÚNCIA CONTRA GLEIDE LIMA
SANTOS (PREFEITA MUNICIPAL DE AÇAILÂNDIA), WAGNER DE CASTRO NASCIMENTO (SECRETÁRIO
DE INFRAESTRUTURA E URBANISMO DO MUNICÍPIO DE AÇAILÂNDIA) E DALVADISIO MOREIRA
DOS SANTOS. PELO REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, FORA REQUISITADO
EM BANCA O IMEDIATO AFASTAMENTO DA SRA. GLEIDE LIMA SANTOS DO CARGO DE PREFEITA
MUNICIPAL DE AÇAILÂNDIA E DO SR. WAGNER DE CASTRO NASCIMENTO DO CARGO DE
SECRETÁRIO DE INFRAESTRUTURA E URBANISMO DO MUNICÍPIO DE AÇAILÂNDIA, BEM COMO A
EXPEDIÇÃO DO COMPETENTE MANDADO DE PRISÃO CONTRA TODOS OS DENUNCIADOS, NO
ENTANTO, SOMENTE ACOLHIDO PELA CÂMARA O IMEDIATO AFASTAMENTO DA ORA PREFEITA E
DO SECRETÁRIO DE INFRAESTRUTURA E URBANISMO DE SEUS RESPECTIVOS CARGOS, NOS
TERMOS DO VOTO DO DESEBARGADOR RELATOR” (página 1 do documento eletrônico 12).
A requerente afirma, de início, que estão presentes todos os
pressupostos necessários para concessão do pedido de suspensão de liminar,
sendo a parte legítima para o ajuizamento da ação que ataca a lesão à ordem
púbica, ante a determinação de afastamento do cargo de Prefeita Municipal.
Destaca, na sequência, que o acórdão que determinou o
afastamento do cargo público assentou-se no fato de a requerente ser “'contumaz
na prática de atos que dilapidam o patrimônio público' e por isso responder 'a
vários processos por improbidade administrativa', citando nesse contexto 'os
autos nº 35172/2014, distribuído à 2ª Câmara Criminal'” (pág. 4 do documento
eletrônico 2).
Quanto a isso, rechaça tal afirmação argumentando que o
Tribunal a apresenta como contumaz na prática de atos que dilapidam o
patrimônio público, mas apresenta um único processo em que ela seria ré.
Diz que esse processo “descrito como de nº 35172/2014,
trata-se de um crime de menor potencial ofensivo, regulado pela Lei dos
Juizados Especiais, no qual a acusada aceitou proposta de Suspensão Condicional
do Processo (sursis processual), nos termos do art. 89 da Lei 9.099/95” (pág. 5
do documento eletrônico 2).
Aponta, ainda, que a Corte estadual sublinha que “há indícios
de que a denunciada pode interferir no andamento do processo e na instrução
criminal (inibindo, por exemplo, testemunhas, muitas delas servidores públicos
municipais)” (pág. 5 do documento eletrônico 2).
Alega, então, que não há qualquer prova ou alegação de que
tenha causado embaraço à instrução processual, até porque o próprio TJ/MA, ao
apreciar o pedido de prisão preventiva, entendeu não estarem presentes “os requisitos
necessários à decretação da prisão preventiva dos denunciados, como disciplina
o artigo 312, do Código de Processo Penal”, reservando-se decretá-la “caso
sobrevenham motivos suficientes para tanto, conforme preconiza o artigo 311 do
Código de Processo Penal, tais como corrupção e ameaça de testemunhas,
dificuldade de comparecimento aos atos processuais e demais termos do processo
que impossibilitem a instrução criminal" (idem).
Sustenta, nessa linha, ter o próprio TJ/AM reconhecido a
inexistência de ameaça a testemunhas ou que a requerente estivesse de alguma
forma atrapalhando a instrução criminal.
Ao final requer que o deferimento da liminar, justificando
que o perigo da demora “advém do afastamento irregular da legítima
representante do povo de Açailândia, a qual sagrou-se vencedora nas últimas
eleições e é reconhecida pelos munícipes como sua verdadeira representante. O
dano já está ocorrendo. Como afirmou-se no relato da causa, o Vice-Prefeito
assumiu o município antes mesmo da publicação da decisão do Tribunal de
Justiça” (página 8 do documento eletrônico 15).
É o relatório
necessário.
Decido o pedido
liminar.
Em virtude de ter natureza de contracautela, a suspensão
exige análise rigorosa de seus pressupostos: a existência de controvérsia de
natureza constitucional e o risco de grave lesão aos valores estimados na
norma. Nesse sentido, confiram-se: SS 3.259-AgR/SP, Rel. Min. Ellen Gracie; SS
341-AgR/SC, Rel. Min. Sydney Sanches; e SS 282-AgR, Rel. Min. Néri da Silveira.
Ademais, a necessidade de a lide versar sobre matéria
constitucional é imprescindível na determinação da competência do Presidente do
Supremo Tribunal Federal para a análise da suspensão.
Compulsando o ordenamento vigente, verifico que as normas
regentes são explícitas ao dispor que somente a grave lesão à ordem, à saúde, à
segurança e à economia públicas autoriza a suspensão da liminar ou da sentença.
É forçoso reconhecer que, em última análise, a suspensão
significa retirar, ainda que temporariamente, a eficácia de uma decisão
judicial proferida em juízo de verossimilhança ou de certeza, na hipótese de
cognição exauriente.
Assim, embora seja vedada nesta esfera a análise de mérito da
demanda, faz-se necessário um juízo de delibação mínimo acerca da matéria
veiculada na lide principal, a fim de se estabelecer a natureza constitucional
da questão (SS 1.272-AgR/RJ, Rel.
Min. Carlos Velloso). É o que passarei a examinar neste
momento.
Com efeito, as medidas cautelares devem observar as garantias
constitucionais que asseguram a todos o devido processo legal e a presunção de
inocência, razão pela qual não deve fazer vezes de pena restritiva de direito,
cabendo aqui, o consagrado ensinamento do Min. Sepúlveda Pertence, de que “as
leis é que se devem interpretar conforme a Constituição e não ao contrário” (RT
680/416).
Não por outra razão, dispõe o art. 282 do Código de Processo
Penal que as medidas cautelares deverão ser aplicadas com a observância do
binômio necessidade/adequação, o qual não me parece estar presente, no caso sob
exame.
Observo, nessa linha, que as medidas cautelares de
afastamento de acusados que exerçam cargo público são excepcionais, não se
podendo utilizá-las de forma subversiva que resulte na deturpação da essência
de seu propósito processual. Em que pese o caráter da medida, que visa
preservar a ordem pública e a segurança jurídica, muitas vezes sua aplicação se
distancia de seu propósito, especialmente quando constatada a possibilidade da
medida cautelar apresentar duração excessiva, inclusive por não se poder
assegurar quanto tempo irá durar a instrução processual. Aplica-se, neste caso,
a percuciente ilação de Rui Barbosa, de que “jamais se podem eternizar medidas
restritivas de direitos, porque sempre estão sujeitas a condições clausulares
dispostas em lei e a limitações no tempo”.
A Jurisprudência desta Corte possui diversos precedentes
sobre o tema, conforme se observa, por exemplo, do julgamento do HC, de
relatoria do Min. Gilmar Mendes, situação análoga a dos autos, cujo acórdão foi
assim ementado:
“Habeas corpus. 2. Operação 'Antidesmonte'. Prefeito
denunciado por suposta prática dos crimes descritos no art. 90 da Lei 8.666/93;
arts. 297, parágrafo único, 288, caput, 312, § 1º, e 313-A, todos do CP; 1º, V
e VII, da Lei 9.613/98 c/c arts. 29 e 69 do CP; e art. 1º, I e II, do
Decreto-Lei 201/67. 3. Afastamento do cargo. 4. Ausência dos requisitos
autorizadores da prisão preventiva. Constrangimento ilegal configurado.
Superação da Súmula 691. 5. Excepcionalidade da prisão. Possibilidade da aplicação
de outras medidas cautelares. Art. 319 do CPP. 6. Ordem concedida, confirmando
a liminar” (grifei).
Transcrevo por oportuno trecho do voto do relator, que bem
elucida o tema: “Na hipótese dos autos, à primeira vista, entendo caracterizada
situação apta a ensejar o afastamento da Súmula.”
No caso vertente, a defesa alega, em síntese, excesso de
prazo na formação da culpa, ao argumento de demora na conclusão da instrução
probatória e ausência dos requisitos autorizadores da custódia cautelar.
Primeiramente, evidencio que a decisão que mantém a
constrição cautelar deve demonstrar sólidas evidências do real perigo que a
liberdade do paciente causaria à sociedade. A mera argumentação abstrata, sem
qualquer inferência tendente a demonstrar a ocorrência, no caso concreto, dos
elementos genericamente previstos na norma, não é apta a manter a segregação
cautelar.
Assim, não havendo essa demonstração concreta, deixa de ser
razoável limitar o direito constitucional de ir e vir, e de responder ao
processo em liberdade, protegido pela presunção da inocência. (HC n. 72.368, rel.
Min. Sepúlveda Pertence, DJ 09/06/2005; RHC n. 71.954, rel. Min. Sepúlveda
Pertence, DJ 03/03/1995).
(…)
De modo geral, a prisão preventiva deve indicar, de forma
expressa, os seguintes fundamentos para decretação da prisão cautelar, nos
termos do art. 312 do CPP: i) garantia da ordem pública; ii) garantia da
aplicação da lei penal; e iii) conveniência da instrução criminal.
Na linha da jurisprudência deste Tribunal, porém, não basta a
mera explicitação textual dos requisitos previstos, sendo necessário que a
alegação abstrata ceda à demonstração concreta e firme de que tais condições
realizam-se na espécie.
A tarefa de interpretação constitucional para análise de
excepcional situação jurídica de constrição da liberdade exige que a alusão a
esses aspectos esteja lastreada em elementos concretos.
No presente caso, o fato de o paciente encontrar-se afastado
do cargo leva-me a concluir não subsistirem razões concretas hábeis a
justificar a manutenção da constrição cautelar, porquanto não possui mais
qualquer influência político-administrativa na municipalidade”.
No caso em exame, o próprio Relator no TJ/MA afirmou que não
estavam presentes os requisitos do 312 do CPP para a decretação da prisão
preventiva. No entanto, afastou a requerente do cargo com base em premissas
abstratas e, porque não dizer, antecipatórias de um juízo condenatório. Nesse
sentido, observe-se o seguinte trecho da decisão atacada:
“Ademais, o afastamento é medida que se impõe, pois, permitir
que a denunciada responsa ao processo, continuando como Chefe do Executivo, é
apostar, confiar, na certeza da impunidade. Se assim não o for, a permanência
da denunciada no cargo, é consentir que a própria, equivocadamente, entenda que
estaria autorizada a continuar praticando atos dessa natureza”. Por essas
razões penso que o afastamento cautelar não pode subsisit. Quanto ao periculum
in mora entendo comprovado ante a concreta possibilidade de que a requerente
seja mantida afastado do cargo para o qual foi eleita até o encerramento do mandato,
sem que a ação penal chegue ao seu final, o que representaria uma clara
antecipação dos efeitos de um eventual juízo condenatório.
Isso posto, defiro a medida liminar, para possibilitar o
retorno da requerente ao cargo que exercia como Prefeito do Município de
Açailândia/MA, sem prejuízo de que o Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão fixe
outras medidas cautelares, previstas no art. 319 do CPP, conforme entender
necessário e suficiente.
Comunique-se com
urgência.
Publique-se.
Brasília, 26 de junho de 2015.
Ministro Ricardo Lewandowski
Presidente fim do documento.
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